quarta-feira, 18 de novembro de 2009

18 de novembro – Um dia especial na Letônia

            Hoje é dia 18 de novembro. Um dia especial na história da Letônia. Paro para escrever estas linhas em meio há muitas atividades. Hoje, como de costume teremos a reunião de nossa célula ou grupo familiar. Mas será um pouco mais cedo, às 18:00hs. A reunião também será mais curta, indo até às 19:00hs. Depois da reunião estaremos indo juntos até o centro velho de Riga (Vecrīga) onde estaremos visitando uma exposição ao ar livre denominada “Starorīga”. É um festival de luzes muito bonito e muitas praças e prédios estão com estas luzes. Também estaremos participando das atividades de encerramento relativas a „Semana da Pátria”.
            Contudo escrevo esta carta em meio a uma depressão coletiva em que todos nós, moradores e principalmente letos quer de sangue ou de coração estamos vivendo. Embora para um visitante tudo pareça normal por aqui e até com jeito de país desenvolvido, a realidade é outra. Já existia e acho que sempre existiu um pessimismo, uma baixa auto-estima pela maioria dos letos. Quando entramos mais profundo na cultura e sub-culturas locais temos a impressão de que grande parte dos letos pensam que qualquer lugar fora daqui é melhor. Ontem mesmo a Elaine e a Raísa foram fazer uma radiografia numa clínica e a médica ou enfermeira que realizou os procedimentos ao ver o passaporte da Elaine perguntou alguma coisa como: “o que você está fazendo aqui na Letônia, por que não está no Brasil?”. Em outras palavras: “você é louca de morar aqui se pode morar em outro lugar?”
            Cerca de dois meses atrás fui pregar numa igreja batista na região de Vidzeme (norte da Letônia). Após o culto um senhor de uns 45 anos se aproximou de mim e disse que gostaria de fazer algumas perguntas sobre o Brasil. Ele logo falou que queria saber como poderia ir para o Brasil. Eu perguntei os motivos dele desejar ir justamente para o Brasil. Ele me respondeu que gostaria de viver num lugar mais sossegado do que naquela pacata cidade de 30.000 Habitantes. Ele disse que no Brasil tudo seria mais tranquilo, mais quente, mais claro, mais tudo. Eu disse a ele que isso não era bem uma realidade e quando pensamos em Brasil não podemos pensar somente em florestas, mas em grandes cidades com suas grandes dificuldades. Ele, como outros letos, pensam que o Brasil é uma floresta, onde todos vivem numa perfeita harmonia com a criação e o Criador.
            No tempo logo após a queda do regime soviético o país estava devastado, o povo sem dinheiro, mas ninguém tinha dívidas. Hoje o povo está novamente sem dinheiro, mas com muitas dívidas, pois muitos, na euforia do capitalismo, compraram carros caríssimos, imóveis super-valorizados. Agora não tem como pagar. Alguns já saíram para trabalhar em outros lugares, principalmente no  Reino Unido e na Alemanha. Mas lá também as coisas não estão fáceis. Já encontrei alguns que ficaram por lá alguns meses e retornaram dizendo que aquilo que viveram lá não é vida. Outros se adaptam melhor e se estabelecem  por lá.
            Alguns especialistas dizem que se esta depressão econômica, social, relacional e este pessimismo coletivo permanecer por mais alguns anos a identidade da nação será maculada.
            Meu ponto de vista contudo é que as coisas não estão tão ruins assim. Estamos, na verdade vivendo um fim de festa. Todos estavam bebendo, gozando suas vidas, com otimismo excessivo, com orgulho de agora pertecerem a União Européia, etc. Agora a festa acabou e todos perceberam que não podem pagar a conta. Acho que é isso. Acho que a Letônia não é assim tão ruim para com seus moradores. Pelo menos isso percebo isso sendo brasileiro/leto. Dou alguns exemplos. Um ano atrás meu filho teve um furúnculo no nariz e após a consulta com nossa médica de família, ela disse para irmos até o Hospital Infantil. Corri com o Guilherme para lá e logo que a enfermeira viu o estado que estava logo disse que ele deveria ficar internado. O Guilherme caiu em prantos perguntando se ia morrer, se aquilo era muito sério, etc. A enfermeira logo disse que tudo estava sob controle. O Guilherme ficou lá e eu fui buscar as roupas dele em casa. Ele ficou numa enfermaria com outros 4 ou 5 meninos por 3 dias. Ao final fui perguntar quanto deveria pagar e recebi a conta: 0,00 Lats. Tudo, estada, alimentação e medicamentos.
            Conheço um jovem senhor brasileiro/leto, irmão em Cristo, que chegou à Letônia a uns poucos anos. No inicio ele pouco sabia a língua mas mesmo assim partiu em busca de um trabalho. Logo conseguiu um trabalho com salário bem baixo, mas permaneceu firme, trabalhando sob sol ou sobre neve. Passou por terríveis lutas, quer materiais, espirituais ou emocionais. Queria muito tirar a carteira de motorista da União Européia e estudou as leis de trânsito e finalmente conseguiu sua carteira. Semana passada ele me telefonou e disse que queria me dar boas notícias. Disse que havia sido promovido à motorista da firma onde trabalha e poderia, em curto prazo, dobrar seu salário. Louvamos a Deus juntos pela grande conquista em meio à tempestade da crise.
            Hoje mesmo conversei com um amigo brasileiro, casado com uma leta. Semana passada ele teve uma crise de apendicite. Sua esposa chamou o socorro médico público que chegou depois de 10 minutos. Ele logo foi levado a um hospital e os médicos diagnosticaram o problema e logo iniciaram a cirugia. Hoje pudemos nos falar pelo telofone mais longamente e ele disse que todo a atendimento, cirurgia e tudo mais necessário foi prestado sem custos, pois ele é casado com uma leta.
            Descrevo isso para concluir que a crise não é somente econômica, mas algo natural e talvez necessário para conter a euforia que existia aqui. Creio que neste dia 18 de novembro, e não somente nele, mas em todo tempo temos que estar intercedendo pela Letônia. Se você tem raízes aqui, se você ama esta terra e nação, peça a Deus que seja misericordioso, que estenda Sua mão sobre o povo, sobre a igreja de Cristo aqui. Peça que a Igreja da Letônia seja mais militante e menos litúrgica, conservativa, silenciosa, contemplativa. Que a alegria de uma Dziesmusvēkti (festival de música e dança que acontece a cada 5 anos) não seja reservado somente para aqueles dias, mas para que aquela alegria, júbilo e dança sejam resultado de um andar diário com Cristo. Vamos trabalhar, vamos orar e interceder, vamos pregar o evangelho do nosso Senhor Jesus Cristo de salvação e alegria a todos que precisam ouvir. “Lai Dievs, svētī Latviju”. (Que Deus abençoe a Letônia)

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